Há passagens pitorescas que sempre recordo, como esta:
Foto: Arquivo Sidney Canto. Cine Guanabara, década de 20. |
Como quase tudo em cidade pequena gira em torno de rivalidade entre duas correntes, ela também existia entre os frequentadores dos dois cinemas santarenos. Haviam os vitorianos e os guanabarinos. Os partidários chegavam ao extremo de “torcer” para que um dia o rival deixasse de funcionar por falta de frequentadores. E não é que esse dia chegou mesmo? O “Guanabara” programara para determinada noite um filme sem expressão intitulado “ O manda chuva” e o “Vitória” lançou em estreia, depois de largamente anunciado, “Cadeira elétrica”, que também não era grande coisa. À hora do início das sessões cinematográficas daquela noite, enquanto as dependências do “Vitória” se achavam superlotadas com espectadores trepados até pelas janelas laterais da varanda do velho Teatro, certamente atraídos pelo título do filme, o seu concorrente não tinha ainda vendido um só ingresso, razão pela qual teve que cerrar as portas, sem funcionar. Quando a plateia do “Vitória” soube do acontecido, quase irrompe em gritos de euforia! Meu pai, no intervalo da 1º parte a 2º parte do filme em exibição, chamou-me a atenção para que eu olhasse pra trás. Era pra notar Miguel Campos e minha irmã Anita, componentes do quarteto do “Guanabara”, encadeirados numa das frisas do “Vitória”, assistindo ao filme “Cadeira Elétrica”. E eu (por que não confessar?) na imaturidade dos meus 15 anos de idade, também vibrei com a esperada vitória do “Vitória”! É que os frequentadores dos dois cinemas se colocaram na mesma posição de aficionados de clubes de futebol rivais ou adeptos de partidos políticos. E o Quarteto “Vitória” executava o jocoso tango argentino “Podre Mascarita”.
Cine Vitória, década de 20. |
Sobre a rivalidade, lembro-me da mulher chamada Conceição que não perdeu uma só sessão cinematográfica do “Guanabara” e seria o maior insulto oferecer-lhe um ingresso para o “Vitória”! E a dona Valentina? Sim, a velha Valentina! Ela tinha um lugar “cativo” nas Gerais do velho Teatro e ninguém ousaria ocupá-lo, sob pena de ter que se levantar a peso tabefes que a “a dona do lugar” distribuía, notadamente quando vinha para o cinema um pouco alcoolizada! E note-se que recebia o apoio dos proprietários do cinema, pela sua condição de “torcedora” e habitue da casa. Coisas de cidadezinha de pouco mais de 5.000 habitantes, como era a Santarém de 1928.
Texto: Meu Baú Mocorongo de Wilson Fonseca.
um relato incrível
ResponderExcluirAchei sensacional esta história e seus comentários, pois trazem um pouco do passado e ocorridos em épocas tão distantes que não conseguiríamos imaginar.
ResponderExcluirEspetacular o texto e a época .
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